A Aventura do Status Quo "festivaleiro"

Assiste-se ultimamente em alguns sectores da opinião tunante a um curioso e saudável debate que basicamente se resume ao facto de existirem tantos certames em tão pouco espaço temporal - entre os meses de Março e Abril, mais concretamente - por claro deficit relativamente aos restantes meses do ano, sendo que em dois meses encontram-se fins de semana com cerca de 5 ou 6 eventos competitivos no território nacional e Ilhas.

Mais do que elencar as razões várias para o ocorrer deste fenómeno sazonal, encontramos no pólo inverso uma situação que, se não totalmente desconhecida, pelo menos estaria a mesma submergida digamos assim, no contexto geral tunante actual, que será a proposição clara de alguns agrupamentos a serem convidados por terceiros para certames competitivos (e é supostamente só para estes e não para outro tipo de eventos) .

Ou seja, se por um lado temos um fartar vilanagem - exagerado a meu ver - de concentração de eventos competitivos num curto espaço temporal - o que suporia em teoria que muitas Tunas estivessem activas nesse lapso de tempo dada a quantidade de eventos existentes - por outro, assiste-se a claros pedidos públicos e frontais - e sem criticar muito pelo oposto, apenas constata-se - para que determinada Tuna actue e se dê a conhecer bem como ao seu trabalho - situação que em teoria demostra a enorme dificuldade em determinados grupos poderem penetrar no calendário "statusquotizado" existente em Portugal a nivel de certames competitivos de Tunas.

Ora, algo aqui se afigura em todo este cenário de forma mais ou menos clara e no presente momento:

- Até que ponto a existência de muitos certames competitivos abarca, pela sua existência, a noção de que há espaço para todas as Tunas? Será que essa correlação existe ou será que é meramente ilusória?

- Sendo ilusória - como me parece aliás - pode-se pressupôr então que o facto de o calendário actual de certames competitivos sobrevive à custa e apenas dos mesmos agrupamentos, da mesma "meia duzia do costume"? E será que sendo assim, temos a noção clara que só a qualidade musical interessa neste apartado e mais nada?

- Assim sendo, poder-se-á pressupôr que os certames competitivos em Portugal sobrevivem dentro de uma noção de cartel que não deixa espaço de manobra a novidades, jovens promessas e afins similares?

Até entendo a normal procura de qualidade das organizações na realização dos seus eventos; afinal, há patamares que toda e cada uma enuncia como sendo necessários para levar a cabo tal desiderato. Pacífico. Mas não será relevante em todo este cenário aferir da real cartelização dos eventos tunantes competitivos ao invés da cada vez menos importância generalizada que as tunas oferecem a outros eventos que não os competitivos? Porque se há muitos festivais certamente haverá poucos encontros de tunas por oposição de fase. Mas aí então como se explica a necessidade que alguns já encontram em adiar datas dos seus eventos competitivos ou de forma publica oferecem os seus serviços para festivais a fim de que "conheçam o nosso talento" (cito)?

Pergunto: O talento só pode ser aferido no suposto status quo festivaleiro existente? Será que não haverá outras formas de se mostrar o nosso trabalho que não um certame? Perguntas que ficam no ar.

Em tempos - e noutros foruns públicos - falei então do perigo que encerra o status quo fechado do circuito de eventos festivaleiros. Hoje constata-se esse perigo pois a "malha" aperta num espaço temporal cada vez mais curto e nenhuma das envolvidas - ou quase - abdica dos seus princípios e alterará as coisas a favor de um todo de forma mais altruísta e não, como acontece hoje, de forma quase nascisisticamente irredutivel e imutável. Se há já tantos certames competitivos em Portugal e a funcionar em "circuito-fechado", pior se torna o cenário quando esse mesmo circuito aperta as malhas para um espaço de tempo compreendido em 8 fins-de-semana, porque assim, passa a existir uma outra noção: a canibalização entre eventos de um mesmo status quo, por manifesta falta de tunas que configurem os tais principios inabaláveis para levar a cabo o evento festivaleiro que joga em espelhos com os demais quer no mesmo fim-de-semana, quer no anterior ou posterior.

Ou seja, temos duas noções que conjugadas entre si configurarão, a meu ver, um cenário e a prazo, de crise - e que paradoxalmente trará como resultado um estender no tempo - ou mesmo desaparecimento puro e simples - dos vários certames ao invés do que hoje ocorre: Certames competitivos em circuito fechado dentro de um status quo que é supostamente inviolável e que, fechando-se ainda mais, leva a canibalização entre certames do mesmo cenário. Já temos situações de "desvio" de convites entre certames próximos no calendário, já temos situações de certames a adiar a data do mesmo - e saíndo assim, das malhas apertadas do "circuito", curiosamente - porque no mesmo fim-de-semana há 6 eventos competitivos, etc.

Note-se com total propriedade que quem faz eventos já há muitos anos noutros períodos do ano não está, objectivamente, sujeito às mesmas condicionantes que os que se realizam em apenas dois meses, porque manifestamente libertos de condições externas mas sim dependentes e só da sua vontade, querer organizativo, estética e objectivos; é mais fácil a um certame em Outubro poder gerir as potenciais tunas convidadas do que a um certame em Março no actual cenário, isto é claro. Respeito total, portanto, pelas convicções estéticas de cada evento competitivo.

Para concluir todo este cenário, constata-se actualmente uma nova tendência até agora desconhecida, que se prende com o facto de que muitas das tunas potencialmente eleitas para o dito circuito estarem cada vez mais a recusar convites do que propriamente a aceitar os mesmos (menos recursos para deslocações, menor disponibilidade face a uma maior solicitação, etc), o que poderia supôr o surgimento de novas oportunidades para outras que não almejavam até agora estar nesses cenários. Acontece é que a tal noção de circuito fechado protagoniza sempre - por ser fechado - a noção anterior de que só estas e só mesmo estas interessam. Logo, até se alteram datas de eventos para se manter a presumivel qualidade do evento. Temo haver aqui um impasse, adendando a este um cenário de canibalização.

Não é menos verdade que outras tunas haverão que nem sequer serão consideradas para os eventos ditos do tal circuito, por muitas e variadas razões que vão desde a falta de postura, falta de qualidade humana e musical, etc e parece-me muito bem. Sempre defendi que antes da música uma Tuna que se preze deve-o Ser de Facto e não apenas de nome. Ninguém convida indigentes que partem hoteis como se calcula; quem pratica vandalismo travestido de academismo deve ser pura e simplesmente banido, ponto final, por muito bem que toque até - regra geral (havendo excepções claro) a indigência comportamental anda de mão dada com a musical.

Mas não é menos verdade que há que ver com propriedade que algumas precisam somente de uma oportunidade, pois são antes de mais Tunas com T maísculo e que poderão dar um maior contributo ao todo do fenómeno. Por outro lado, também há que o dizer claramente: para colher há que semear, portanto, se de facto - e assumindo porventura que o certame competitivo é o evento que mais visibilidade oferece - então há que penar, que ir à luta, que fazer pela vida; mais tarde ou mais cedo - até pelas vicissitudes actuais que já referi - essas oportunidades surgirão naturalmente, haja o já referido Saber Ser e Saber Estar.

Comentários