A Aventura Canária....

Recentemente o mundo folclorista Canário em particular e latino em geral foi surpreendido - restará apurar até que ponto terá sido surpresa - pela saída de 17 componentes do grupo canário Los Sabandeños, seguramente o mais representivo, conhecido e afamado grupo de cordofones de toda a Península Ibérica e provavelmente até de todo o mundo.

Desses 17 elementos agora saídos constam nomes tão conhecidos do grupo e a ele conectado como sendo Hector Gonzalez, até agora seu Director Musical e desde 1989, tendo sido responsável pelos arranjos insertos em discos tão conhecidos como "Bolero", "Mar", "Los Tres Reyes Magos", Gardel" ou "Cuba Profunda", entre outros - Manolo Mena, um dos seus mais destacados solistas em temas tão conhecidos como "Aquella Tarde" por exemplo ou ainda Marco del Castillo, umas das mais recentes incorporações, entre outros destacados e ilustres componenentes. De referir ainda a anterior saída de Manuel Ramos, também ele figura muito associada ao grupo, nesta que é e desde a fundação do grupo, a terceira e mais grave crise do mesmo ao longo destes 40 anos. Surge entretanto e neste mês o grupo Balango, com Hector, Marco del Castillo e Candelária Gonzalez como figuras de referência.

A imprensa local de Tenerife e Canária aponta várias razões para esta situação, entretanto contornada pelo Director Musical do grupo, D. Elfídio Alonso, com a captação - alguns meios chamam directamente ao facto "roubo" - de outros tantos componentes de vários grupos canários, a fim de colmatar essa cisão e de prosseguir, assim, a sua actividade, facto que ocorre actualmente e com a direcção musical do produtor e compositor Benito Cabrera.

Vários meios locais, como dizia antes, afirmam que tal cissão se sucede por força da vontade ditatorial daquele que é o e cito "dono e senhor" do grupo, D. Elfidio Alonso, que dispensou e na base desta crise, Hector Gonzalez quer da direcção musical, quer do próprio grupo. Como resultado, surge no seio dos agora 17 elementos saídos de Los Sabandeños um novo grupo intitulado Atlantes.

Muitos nas Canárias previram já e aquando da saída à uns anos atrás de Manuel Ramos este actual cenário no seio do grupo canário. Aliás, já aquando do espectáculo em Cedeira (Ferrol) em Agosto de 2005 se sentia junto do grupo algum mau estar pelo facto de os ensaios períodicos não serem frequentes e só ocorriam aquando da gravação de um CD, facto que ao que se sabe, terá sido um dos motivos de conflito entre alguns elementos do grupo e o seu Director, para lá da distribuição dos royalties de actuação e forma de o fazer entre os elementos do grupo aquando das actuações ao vivo do grupo canário.

A opinião publica canária - a que mais vive este grupo seguramente - invoca algum distanciamento do grupo face aos valores do folclorismo canário que supostamente Los Sabandeños deveriam defender como o fizeram anteriormente e não se sujeitarem à lei do dinheiro e das edições de CD´s em formato de colectânea por alturas do Natal (citando o forum do site bienmesabe.org , site dedicado ao folclore canário e onde este assunto é debatido de forma efusiva e quase a raiar a lógica de um forum sobre futebol ou algo similar..). Convem dizer que esse suposto distanciamento é sempre polémico pois grande parte da cultura latina e hispanica resulta de séculos e séculos de aculturação entre as próprias Ilhas canárias e no caso com a América Central e do Sul, resultando daqui óbvias e claras familiaridades estético/musicais e culturais até.

Muito do acima dito, para lá de amplamente conhecido por parte dos amantes deste grupo impar e do folclore Canário, será muito do dito entretanto verdade insofismável: Se o folclore Canário mudou com Los Sabandeños, essa mudança procede-se muito em parte a custo da pureza folclórica e tradicional e no caso, das Ilhas Canárias. Prova inequivoca de tal será constatar-se na discografia do grupo (extensa por sinal) que a 1ª metade da existência do grupo reflete precisamente o folclore Canário e suas formas de expressão - folias, parrandas, isas, etc - e a 2ª já reflete muito mais que o folclore Canário nas suas formas latinas mais abrangentes geograficamente falando - boleros, musica cubana, zambas argentinas, habaneras, tangos, musica andina, etc. Curiosamente será aquando desta segunda fase que porventura o grupo atinge maior prestígio e reconhecimento internacional, o que faz todo o sentido dada a "globalização" de temas tão conhecidos internacionalmente como " Guantanamera" e só para citar um exemplo por demais afamado. Certamente "Guantanamera" será bem mais conhecida que a "Cantata del Mencey Loco" ou "Missa Sabandeña", dois exemplo bem antigos da visão folclorista do grupo Canário. O que não reduz a importância da fase ou vertente folclorista de Los Sabandeños e sua importância no mesmo contexto.

Não resta porem, duvida alguma, que a projecção internacional do grupo Canário levou a que outros povos conhecessem mais do folclore Canário (algo impensável se tentarmos encontrar algum paralelo por exemplo aqui em Portugal) e, assim, cumprir com a sua missão. Acontece é que um grupo com mais de 40 anos só poderá sobreviver aos mesmos - entre 3 crises e no caso - tendo a clara noção de que terá de abrir horizontes de inovação, mesmo correndo o risco de ser apelidado pelos puristas do folclore canário de "peseteros" ou outros "mimos" do género. Não é menos verdade que comparar pelo ponto de vista Los Sabandeños com Los Gofiones é e será sempre uma comparação perigosa, pois se Los Gofiones são porventura mais fieis ao ideário folclórico Canário, estes mesmos já variadas vezes fizeram incursões por outras sonoridades latinas mais universais, ou seja, padecerão do mesmo "mal" (aspas aqui mesmo entre aspas) dos seus arqui-rivais Los Sabandeños. Curioso constatar que uma das figuras que colaborou no ultimo espectáculo de Los Sabandeños realizado recentemente é precisamente o Director Musical de...Los Gofiones, Victor Batista.

A actual polémica em torno de Los Sabandeños só se coloca precisamente porque de Los Sabandeños se trata e no caso, prova (mais uma) inequivoca da real importância do grupo Canário em todo o panorama musical quer Canário, quer latino em geral, polémica que só faz sentido se vista pela óptica do utilizador e no caso, de todos os aficionados quer da musica Canária, quer do grupo em questão.

D. Elfidio Alonso é apontado como um dos responsaveis pela saída destes 17 elementos; quiça no futuro seja apontado pelo surgimento ainda que indirecto do grupo Atlantes pela mesma via de razão, contribuindo assim para o enriquecimento do já riquissimo folclore Canário e Latino em geral. Muitos antes passaram pelos Los Sabandeños e dele saíram a seu tempo; as razões serão sempre algo particular e de análise própria do grupo que a elas se vincula ad eternum. A apresentação recente do grupo com esta nova formação - de talentos desconhecidos e captados noutros grupos mais pequenos e de menor projecção - prova, ao que se sabe, que o grupo continua firme na sua qualidade e trabalho, apenas mudando por força da troca de componentes alguns detalhes que a falta de habito face aos recêm chegados ou a mais que habitual simpatia auditiva face a Mena ou Hector por exemplo, provoca naturalmente nestas circunstâncias.

D. Elfídio poderá, porventura, ter agido de forma ditatorial em toda esta questão mas a verdade é que Los Sabandeños estão e continuam aí, a ver pela agenda para este Verão, e com qualidade acima da média como é apanágio do grupo. Aumenta assim, a curiosidade para ver o que Atlantes apresentará a todos os aficionados. Ganha, assim, a musica latina em geral, apartadas que estão agora as vontades, pois se antes no mesmo grupo não se entendiam os seus componentes, agora estão mais que entendidos seguramente, ficando tudo claro. As restantes questões internas só ao grupo pertencem e a ele cabem gerir.

Seguramente que Los Sabandeños levarão a sua trajectória em frente como têm feito ao longo destes mais de 40 anos. Seguramente que não perderemos musicos fantásticos e folcloristas fantásticos como Mena, Hector ou Manuel Ramos entre outros, pois continuarão a dar o seu contributo fantástico, as suas vozes e arranjos incomensuráveis mas agora noutro contexto. Há que ver tudo isto com a necessária normalidade. Ao que parece, já está reposta com o anúncio de Elfídio Alonso que Los Sabandeños irão editar no final do ano um CD + DVD do espectáculo realizado em Março último em Tenerife, comemorativo dos 40 anos do grupo. Escutaremos então o "novo" som do grupo, sendo que abaixo já poderão ficar com uma pequena ideia do mesmo, com estas imagens captadas em Fevereiro ultimo no Chile onde se poderão escutar dois temas: "El Colibri" e "Folias Parranderas", curiosamente a 1ª uma "habanera" e a segunda o 1º tema que Los Sabandeños tocaram, então, à cerca de 40 anos atrás na sua 1º apresentação pública....

Comentários