A Aventura "In Medium Virtus"


In Medium Virtus. Ou seja, no meio está a virtude.

Muito poderão alegar até - mesmo sendo a tradição tunante anterior ao ressurgimento distinta da que foi criada há 20 anos atrás grosso modo – que a única obrigação que uma Tuna universitária tem será apenas a que decorre da música que produz em palco. Como outros poderão alegar igualmente que não há mais qualquer obrigação por parte de uma Tuna do que ser um constante carrossel de anedotas ou cenas teatrais ou o que bem se entender. Não é essa, porém, a prática reiterada dos pós ressurgimento tunante, onde pelo menos a esmagadora maioria desses artistas esforçados de então mas musicalmente medíocres mantinha-se pró forma, ou seja, mantinha as aparências de Tuna universitária e ou académica. Pelo menos, manteve-as.

O ressurgimento Tunante andou a par com o ressurgimento da Praxe em todo o país – embora a velocidades distintas e com custos que hoje vemos também no mundo tunante – e isso influenciou sobremaneira o conceito de Tuna Universitária e/ou Académica, queira-se ou não. Até influenciou ao ponto de algumas – muitas – tunas hoje que se apresentam SÓ de uma determinada forma, com UMA só faceta distintiva face às restantes, quando antes não se apresentavam assim, muito pelo oposto.

A procura de um distinguir a todo o custo leva necessariamente a um radicalizar de posturas, querer sair do médium virtus a toda a força como forma de distinção, demarcação clara, numa espécie de narcisismo tunante que é absolutamente alheio aos valores mais humanos que a Tuna universitária detêm desde há séculos, note-se. Como foi dito e bem, não são néscios esses mesmos que se demarcam, antes pelo oposto, pois fazem-no sabendo claramente como, quando e porque o passaram a fazer, bem como sabem qual o catalizador para tal radical mudança, para tão extremo posicionamento.

Ontem as “orquestras de carrancudos” não o eram, não o foram, uns mais outros menos mas não o foram – a memória de 20 anos não é assim tão curta. Como os “grupos de saltimbancos” também no passado não o eram exclusivamente, se olharmos até caso a caso. Muitos, senão todos, os que afirmam HOJE que SÓ a música conta, antes até têm gravadas em CD´s e vídeos, de forma ad eternum precisamente o oposto. Como aqueles que HOJE afirmam que BASTA ser-se engraçado para cair em graça tunante quando também há no passado registos que provam precisamente..o oposto.

Que se passou então, entretanto, para deixarmos de ouvir o Donald a contar a “adenota” do “tá”, por exemplo?

O que se passou é que o modelo centrado ao meio, supostamente virtuoso, cansou, saturou-se e saturou alguns, somando a isso uma natural procura em inovar que é fruto dos avançar dos tempos. Há então que sair do meio – portanto, da virtude – e passar para as pontas, para os extremos do fenómeno (e alguns hoje para lá desses extremos, portanto, FORA do fenómeno) nem que isso implique chocar tudo e todos, seja com que método seja, de que forma for, desde que choque.

Faz parte, aliás, de uma pseudo-aculturação ao mais puro estilo Dragon Ball que nos traz as coisas mais fantásticas que se possam imaginar, o tal “second life” tunante a que já me referi antes. Nada de novo num meio Tradicional por excelência, apenas a forma é que se vai alterando: Tot sensus quot capita, ou seja, tantas ideais quantas as cabeças. A Ultima Ratio ou argumento final é evidente: porque “somos assim”, provando – erradamente - que a vontade de cada um é vontade Nec plus ultra: nada existe superior. Postura imprudente, até.

“Nascem” assim e neste contexto de massagem tunante ao próprio ego, com a natural (??) cumplicidade de uma Tradição que condena pelas palavras e não pelos actos – até ao dia… - as Tunas In Vitro, que alegam sistematicamente Honoris Causa, afirmando bem alto Ergo sum qui sum – eu sou quem sou - nem que isso vá contra a casa que nos recebe; ou seja, eu cuspo para o chão mesmo que o chão seja o de todas as Tunas porque…”eu sou quem sou” e “eu sou assim”. Nihil obstat????

Se somarmos a isto uma clara tentativa em ridicularizar a Tuna enquanto tal por parte até de algumas ditas, dispensando assim os já mais que muitos detractores externos e dando a estes mais argumentos, ainda há no meio quem tenha uma certa vergonha em dele fazer parte – já não tendo qualquer vergonha em desse meio retirar dividendos próprios, curioso de facto - provando que, de facto, é no meio que está a virtude.

Quando alguém saí a terreiro e mostra que o Rei vai nú ainda por cima é brindado com chavões e lugares-comuns, tratado como se fosse um “espião ao serviço do KGB que passa informações aos Americanos”, numa clara inversão do ónus do crime: Quem está mal não é quem denuncia mas antes quem é denunciado e por factos concretos (vide a paródia podologica que animou a primeira metade do ano, por exemplo) que não se podem negar sequer

Então e onde cabe o plural na 1ª pessoa? Onde fica então a Tuna Universitária e/ou Académica no meio de tanto “umbiguismo”, egocentrismo, radicalismo? É a pergunta que fica por responder. A liberdade é mais destruída pelos seus excessos que pelos seus inimigos. A liberdade não consiste em fazer o que se quer, mas o que se deve. In Medium Virtus.

Comentários

Eduardo disse…
Caríssimo:

o bom humor, como a capacidade de composição, não se transmite de geração em geração - ao contrário dos segredos dos druidas antigos. Quando Panoramix morrer, não morre com ele o segredo da poção mágica, mas pode muito bem perder-se a ética com que era usada, e o novo druida pode lembrar-se de dá-la ao Obélix, com os resultados mais que previsíveis...

A tuna não é uma receita: é uma vivência. Como todas as vivências, é pessoal e intransmissível.

Por que razão se acabaram os Afonsos, os Traçadinhos e quejandos? Será má vontade? Será desatenção ou expurgo? Ou será que Vicente só há um?

Como é que se acabaram as três pernas do pandeireta ou as «adenotas» do «Ronaldo»? Será «carrancudismo» a mais, negação das origens? Ou será que Almeida e Ricardo Portilha são irrepetíveis?

Velhos tempos das entradas em procissão que fizeram a Aula Magna rebentar de riso; que comoveram Múrcia até às lágrimas, que fizeram moças do saudoso «Lagar do Azeite» da não menos saudosa N1 (6 horas de viagem até Lisboa: até tempo houve para as Ondas do Douro, e outras impróprias para consumo público - parental advisory) sonharem noites a fio com o ilustre desconhecido que larga do autocarro o seu lenço branco e outras tantas histórias do c* mais peludo de que em tuna (e na N1) há memória.

Isto não se ensina nem se aprende. É geracional e nada há a fazer.

A não ser assim, ainda hoje a tua tuna, contra ventos e marés, seria a da Lusíada. Mas não: a TUA tuna é aquele conjunto de gajos com quem poderias escrever em conjunto aquela magnífica oitava inscrita na pedra: «Talvez a pedra chorasse...» São aqueles por quem, Fausto moderno, venderias a alma a Mefistófeles para teres mais um século de perene juventude.

Para mm, é a tuna que apresenta um inédito de João Domingos Molotofv, cuja efígie é «estranhamente» parecida com o mostrengo da Super Bock Abadia - e isto vinte anos depois de a vida ter amansado os lombos...

Por tudo isto sempre achei e continuo a achar que uma tuna não deve ser premiada pelo conjunto dos seus caracteres individuais, mas por aquilo que, independentemente do tempo e das pessoas, faz: música.

Também Panoramix (Astérix entre os Godos) foi premiado com a foice de ouro não pela ética, mas pela poção mágica, essa, sim, transmissível de geração em geração.
Meu Caro Eduardo:

Concordo absolutamente contigo e com o que dizes. Vivências e não fórmulas. E é precisamente aí que reside a questão nuclear a meu ver nesta temática. Usei como exemplo o "teu" Ronaldo como poderia usar N de outros exemplos, somente isso, que ilustram esta minha reflexão. Nem sequer me sinto no direito de cobrar ao Sr. Molotov a reprodução das piadas de ontem hoje, nem sequer faz sentido tal coisa; As vivências como dizem são fundamentais e é exactamente por isso - ou pela falta delas como envolvente da Tuna - que vingam hoje "fórmulas", sucedâneos, etc, etc etc que passam por vivências mas que não o são de todo.

A Tuna de cada nós é aquela onde nos sentimos bem a vivê-a, simples. É aquela que fica a comer uns bons "pata negra" e a degustar uns bons vinhos tranquilamente, como grupo que quer viver certos e demasiados momentos apenas; o resto é reflexo disso também.

Forte abraço!
Curioso, meu caro:

A questão aqui é que há muitos "Obelix´s" que continuam a pedir poção mágica ao Druida panoramix, mesmo sabendo que cairam no caldeirão quando eram pequeninos...

Abraços!