A Aventura da Inteligência

Quando uma espécie se encontra em perigo a mesma tende a proteger-se, é uma regra quase universal até, nada de novo.

Para que a sua manutenção seja efectiva, a espécie ameaçada procura deixar de lado aspectos menos relevantes e valoriza outros contextos que, porventura, noutras eras, seriam até vistos de forma depreciativa. A necessidade aguça o engenho e como tal, aguça as soluções. Foi precisamente isso que a Tuna em Espanha fez a seu tempo. Umas mais cedo - como forma de afirmação colectiva e pujança temporal do fenómeno Tuna - outras mais tarde - e já numa perspectiva de contornar as óbvias dificuldades que as Tunas espanholas sofreram após os anos Oitenta do Século XX, onde deixaram de estar "na moda", perdendo projecção no pós "Gente Joven" e com isso, definhando.

A forma que a Tuna espanhola encontrou - e pelo menos esta - foi a constituição de circuitos de Tunas em razão cientifica, ou seja, o nascimento de circuitos de Tunas de vários cursos desde o de Medicina, Direito, Económicas, passando por Engenharias várias indo até ao de Magistério, só para citar alguns. Estes circuitos possuem na sua estrutura uma lógica evidente, a do prolongamento no terreno da tradição tunante, com regras que passam por obrigações face ao conselho de tunas respectivo e mantendo uma rotatividade quer na sua representação a nivel hierárquico terminando pela mesma rotatividade na organização de um certame anual e sempre numa diferente localidade, conseguindo com isso manter vários traços genéticos da cultura tunante: intercâmbio, instinto migratório, representação cultural e por aí fora. Para se ter uma ideia, há circuitos de Tunas espanholas que têm muitos mais anos que 99% das tunas portuguesas.

Mas porventura o mérito principal da existência destes circuitos - muitos deles activos ainda hoje - será o de manter laços entre varias Tunas e potenciar esses laços no tempo e no espaço, não permitindo pela sua própria existência crasses temporais de inactividade que são uma espécie de ante-câmera para a dissolução e/ou inactividade de uma Tuna. No caso até várias são as Tunas de circuito em razão de matéria que apenas no respectivo certame de circuito actuam e se apresentam quase propositadamente para o mesmo - estando quase inactivos durante todo o restante ano - mantendo assim a chama viva. Ou seja, foi a fórmula encontrada para a cada vez maior dificuldade que as tunas espanholas têm ainda hoje em manter-se à tona (salvo excepções conhecidas) o que revela desde logo algumas coisas.

- A necessidade aguça o engenho: A Tuna aqui procurou dentro de si mesma a solução, não se deixando marginalizar pelas dificuldades crescentes;

- Sentido Voluntarista: A Tuna aqui procurou ceder um pouco nas suas esferas próprias em favor de um sentimento e objectivos colectivo com o fito de manter a sua própria actividade; antes negociar alguma perda de autonomia própria do que desaparecer por força de um egoísmo cego que não admite um milímetro de cedência.

- Sentido Corporativista: A Tuna aqui usa o pretexto da mesma razão cientifica (somos todos de Direito, p.ex.) para poder coexistir e desenvolver-se num meio social cada vez mais adverso.

O modelo de Circuito é ainda hoje um modelo válido, que permite aferir várias coordenadas desde logo, desde quem está no terreno, quem está activo, quem não está activo, que tunas se destacam em cada um dos circuitos, onde se realizam certames de circuito (podendo-se ver quem tem capacidade para organizar ou não eventos tunantes) entre outras coordenadas relevantes. Ainda hoje há circuitos em razão de matéria que começam a dar os seus primeiros passos (por força precisamente do tal instinto de sobrevivência colectivo) e circuitos há em Espanha que começam a perceber que essa noção pode ser alargarda pela inclusão de tunas portuguesas, como ocorre p.ex. com o Circuito de Tunas de Ingenieros Agrónomos já hoje Ibérico.

Mais que o modelo, a lógica, a perspicácia e a inteligência a funcionar. Basicamente será a conjugação na 1ª pessoa do plural, ou seja, "nós fazemos bem" e não o tradicional isolacionismo de que a Tuna portuguesa tanto padece, por exemplo, preocupada antes com o "eu faço bem" e por aí se fica. Até quando?

Poderá ser este um caminho, embora por razões distintas, para a tuna portuguesa, aliando estruturas já existentes por um lado a uma cada vez maior "segmentação de mercado" da tuna nacional por outro. Se por cá o excessivo número de tunas é um problema, pelo lado espanhol será o oposto. Se por cá a diversidade - e o exagero que passa dos limites do que é Ser Tuna - é um problema (não pela diversidade em si mas sim pela desmesurada e patética procura de uma diversidade que muitas vezes roça o bizarro e inqualificável até) pelo lado espanhol o problema foi o oposto, poucas e quase todas iguais umas às outras.

Curiosamente e pelo lado de "cá", poderá ser o modelo de circuito alargado no mapa que fará, auxiliará, catalizará uma cada vez maior segmentação que quanto a mim se impõem claramente numa "selva" tunante que muitas vezes de Tuna nada tem. O modelo de circuito será também para as tunas portuguesas e a prazo médio um factor de diferenciação positivo.

Comentários

Carlos Llanza disse…
Muy interesante Blog, amigo Ricardo. DEsde Jerez de la Frontera (España) recibe un fuerte abrazo de un tuno y amigo. Carlos "Conan"
Amigo Carlos:

Gracias por tu visita virtual y por tus palavras.

Saludos!
J.Pierre Silva disse…
Boa análise. Temos, de facto, muitos exemplos a colher do lado de lá da fronteira.