A Aventura do Conhecimento Tunante

Uma das coisas que mais me intrigou no passado recente e ainda hoje é motivo de alguma admiração reporta-se concretamente à real disponibilidade interior que cada um de nós, Tunos de facto, deve ter face ao conhecimento Tunante, ao real conhecimento Tunante.

Se no passado recente não existia essa disponibilidade por força de um "boom" tunante que se preocupou apenas em viver e a sentir o mesmo a uma velocidade vertiginosa - até pela falta inequívoca de referências - já hoje em dia e passados quase um quarto de século sobre o (re)surgimento Tunante em Portugal, haverá acima de tudo que pensar sobre a disponibilidade interior de cada um de nós sobre o fenómeno tunante - e já mais alicerçado pela "praxis" que estes anos nos trouxe. Mais que estudar-se o fenómeno convirá agora pensar o que estará por detrás desse estudo, quais as reais motivações, qual a necessidade do mesmo estudo existir de facto, qual a nossa - de cada um - predisposição para ir mais além, mais fundo, concretizar enfim sobre o fenómeno tunante nacional.

1ª nota a marcar desde logo: O que falta saber é incomensurávelmente maior face ao que já sabemos. Quem se achar sabedor de mais do que realmente se sabe de facto está a incorrer num erro crasso, para lá da altivez e arrogância: no erro. A pesquisa de facto sobre o fenómeno nacional tem muita matéria que se encontra - como várias vezes o disse aqui e em outros foruns in loco e virtuais - fora de Portugal e para se saber onde anda essa matéria há que ir às fontes - coisa que até agora só ao de leve se aflorou por parte dos poucos estudiosos conhecidos sobre a matéria. Nada garante que não haja muito boa gente possuidora de material, estudos, pesquisas, levantamentos, por este país fora e que pura e simplesmente - até por vicissitudes da própria vida - se encontra enterrado num qualquer baú de memórias dos seus tempos de Tuno. Em suma, reporto-me ao 2º erro crasso na procura do conhecimento tunante: achar-se que o mesmo é monopólio de meia dúzia de eruditos. Não o é e digo-o com particular agrado, por um lado e triste por outro porque seguramente que há por aí perdido neste Portugal muita e boa gente com informações preciosas e que dariam uma adenda valiosa ao estudo sobre o conhecimento tunante que, por tal, não é monopolizável sequer seja por quem seja.

A atestar o que disse antes, não se poderá confundir o esforço e exposição de alguns face a esse contributo com o silêncio ou esquecimento no baú de outros; estou mais que convicto - e porque conheci alguns que hoje nem sei onde moram sequer - que há muito e bom Tuno repleto de estórias, conhecimento, informação e pesquisa que em muito ajudariam ao todo, ao esforço de todos.

O atrás dito subsidia outra noção: não são a meia duzia que hoje se esforça que carrega o peso e a obrigação de informar e formar correctamente, não é monopólio desses essa missão e muito menos serão esses os "donos da bola" numa atitude tipica de menino dono da mesma no recreio; os que estudam a Tuna e dão a cara por esse trabalho têm dois méritos desde logo: estudam e partilham o mesmo com todos: de nada servirá o conhecimento tunante se não for partilhado.

O conhecimento tunante é, deverá ser, empreitada de todos os que são realmente Tunos. Como o fazer? Uns estudam e outros subsidiam esse estudo com o contraditório. Para se aprender é necessário saber-se onde está o erro e assim, evitá-lo, fazendo as coisas direitas por consequência. Não me parece de todo boa pedagogia tunante criticar do nada quem se expoe ao contraditório por dizer meia dúzia de asneiras, desde que quem se exponha esteja disposto a aprender; é tão criticável o professor que dá reguadas por se errar e não explica depois como se faz bem como o será aquele que erra porque pura e simplesmente não quer aprender de todo, achando-se dono e senhor da razão e mestre-escola tunante que só ensina e por isso, nada terá a aprender.

Foi - e continua a ser - erro de palmatória, de meninos como se diz, cair em duas falácias: Arrogância a mais dos que julgam tudo saber e humildade a menos dos que sabem e julgam nada ter a aprender. O conhecimento tunante português ainda não permite a existência - ao contrário de Espanha - de Tunólogos de facto. Louvor a quem a esse conhecimento se dedica mas atenção, que saiba passar o testemunho, não se arrogando de uma infinita presunção do tamanho do erro que está a cometer com a mesma; manter a humildade, o esforço e ouvindo as asneiras para as corrigir é o caminho mais sapiente na ainda pueril pesquisa sobre o conhecimento tunante.

Como dia alguém, é mais sábio aquele que escuta um conselho do que aquele que o dá. E é preciso que o Tuno de facto, hoje, escute os conselhos, ensinamentos, pesquisas, estudos, etc. E isso só é possivel havendo predisposição de quem ensina em aprender e de quem aprende em ensinar até. Sim, porque eu aprendo todos os dias coisas sobre a Tuna e acho imensa piada à minha ignorância sobre a matéria; só assim me mantenho motivado para aprender mais e mais.

Em suma, é tão ridiculo hoje haver quem não queira aprender de facto como será tão ridiculo haver quem julgue que consegue "meter" num ano duzentos de conhecimento tunante...Calma com o ândor que a procissão ainda nem sequer vai no adro, pura e simplesmente ainda nem tão pouco está o andôr aos ombros dos romeiros....se vai com pressa para sair da igreja ainda pode cair ao chão....

O conhecimento Tunante deverá ir devagar, assente em claras verdades de facto, dismistificando pedagogicamente os erros e as invenções e não depressa a correr numa ânsia desenfreada, assente em meias tintas e muito menos negando-se ao contraditório de todos os que querem de facto saber mais e melhor; aborrece-me sobremaneira aquela "cena" à Estado Novo do Sr. Mestre Escola falador pelos cotovelos e dos seus pulilos caladinhos a transcrever a cátedra, como qualquer universitário facilmente concordará. Devemos todos nós - os que investigam e os que querem beber ensinamentos - à Tuna tranquilidade na postura, discernimento no estudo, ser-se assertivo e acima de tudo, sermos pedagogicamente Tunos, entre todos nós. Aliás, os que mais estudam a Tuna deverão ser aqueles que mais humildade para aprender devem mostrar.

Comentários

J.Pierre Silva disse…
Nem mais!

O tamanho daquilo que está, ainda, por descobrir leva-nos a sermos humildes perante a grandeza dessa tarefa de descobrir e recuperar.
O que também julgo importante é percebermos que dificilmente se conseguirá trazer tudo "à tona", daí que importa que aquilo que já é conhecido, que já foi estudado, possa ser partilhado e assimilado por todos, sempre na atitude aberta e expectante de que, amanhã, poderão surgir dados que venham completar, ou mesmo desdizer, o que hoje se sabe.

Pesoalmente, aquilo que ainda me preocupa, não se prende com o que falta saber, mas com o facto do pouco que se sabe ser pouco sabido pela maioria daqueles a quem esse conhecimento se destina, em primeiro lugar.

O problema do "monopólio" apenas se prende pelo facto de serem muito poucos, ainda e infelizmente, a dedicarem-se ao estudo do assunto em causa. Mais houvessem e teríamos mais qualidade e diversidade, mais contraditório e uma menor exposição dos poucos que se esforçam nesse sentido (ainda olhados como "seres estranhos").
O saber é de todos e não apartado privado dos tais "eruditos", mas julgo que o problema não está em quem sabe já alguma coisa mais (e que não se resumem, certamente, a uma meia dúzia), mas a quem convém que se viva neste estado de obscurantismo que abre portas a neo-tunantismos.

Apenas uma coisa se exige a todos, tal como me exigo a mim mesmo: a vontade de aprender e saber mais. Pior do que não saber é não querer saber!

Há já muito que percebi o quanto sei pouco do assunto, talvez por já há muito o andar a estudar (e aplica-se, perfeitamente aqui o pensamento socrático).
O primeiro passo é levar outros a perceberem que sabem pouco ou nada (despertar essa consciência) de modo que encetem, também eles, a aventura de procurar respostas (falta, ainda, espicaçar a curiosidade da nossa comunidade).

Assim, eu diria que muitos dos tais "eruditos" são, acima de tudo, curiosos, tunos cuja curiosidade é maior do que a maioria dos demais.
A sua função não passa por ensinar,mas por despertar curiosidade, a partir daquilo que a sua curiosidade já produziu.