A Aventura do Eticamente Correcto.....

Da Ética de um Jurado.

Parece evidente que para lá das habituais regras que balizam a avaliação de um jurado em ambiente de certame competitivo – e já me escuso de comentar que em muitos nem sequer os há, que fará aplicar seja que regra seja …. – haverá que constar, e universalmente para qualquer componente de um Jurado, a existência daquilo que se poderá chamar de ética, que, na sua essência nuclear reporta-se aos actos do ser humano, enquanto ser possuidor de razão. Os actos que são livres e, enquanto tais, "correctos" ou "incorrectos", "justos" ou "injustos" – de um modo mais simples, "bons" ou "maus". Não só cabe esta constatação ao Jurado como antes à própria organização de um qualquer evento competitivo; se não há qualquer sinal ético a montante, não se esperará que haja a jusante.

Como parece evidente, não há postulado regulamentar algum que controle a ética dos componentes de um Jurado, seja em que campo seja e, na estrita esfera de um jurado de certame, não haveria, pois, de ser algo distinto, como facilmente se depreenderá. Muitos certames em Portugal por demissão, por um “quero-lá-saber” ou mesmo incúria, estão-se particularmente nas tintas para a ética – e bem sabemos que em muitos casos as “organizações” só se lembram do Júri na véspera, aparecendo o que se sabe e vai vendo, sabe Deus, Alá ou as sagradas vacas Indianas como e porquê. Se não há ética a organizar, porque carga de água haveria de se esperar a mesma no final das “hostilidades”?

Aliás, a existência de regras e depois a sua pura e dura não aplicação não bastará para conferir ética à suposta competição; de que vale ter regras para depois os papeluchos estarem aos pés do Jurado, deixando-o ao sabor de cada uma das éticas presentes no mesmo? Ora, haver regras não significa, pois, que haja ética em todo o processo, pois se não aplicadas e com ética, de nada valem, será igual a não haver regras. A montra não espelha o armazém, se assim quisermos. Mais adianto, infelizmente, esta situação é o prato do dia.

Mas detenhamo-nos concretamente na questão da ética de um Jurado. A missão por si só é deveras complicada, seja para quem seja mas sempre com o mínimo de ética; só é fácil avaliar outros seres humanos numa de duas circunstâncias: quando não se é eticamente correcto ou então quando se está absolutamente por fora do objecto a avaliar. Não tenho dúvida alguma que para um Presidente de Junta avaliar Tunas é uma espécie de “frete” que, por sê-lo, o faz então com uma perna às costas, não dando importância sequer à missão que detém em mãos. Por isso mesmo é que o “paraquedista” não deve nem pode compor um jurado de um certame de tunas, precisamente porque o assunto lhe é completamente indistinto, logo, indiferente, logo, uma “seca”. Poder-se-ia aludir então – com carácter preventivo - ao seguir das regras tout court mas aqui, nesta circunstância, pedir ao “paraquedista” tal missão é tão perigoso como colocar num salto de para quedas um “caloiro” que apenas teve aulas teóricas de como puxar o fio e nunca entrou dentro de uma avioneta, sequer. Mais uma vez, as regras teóricas não bastam.

Por outro lado – e no campo estrito da ética – um jurado composto por meros interessados na matéria revela-se algo eticamente duvidoso; se nuns casos pode resultar até, noutros oferece sempre uma dúvida à priori, que se mede pela estrita natureza do seu interesse, apenas. Se nunca fez parte, se nunca foi, se nunca esteve, como consegue eticamente gerir a posição de avaliador de alguém que está, é e faz parte? Se num jurado de um concurso de meros talentos diversos se pode ter um humorista, p.ex., já não se me afigura plausível e eticamente correcto numa cultura tão especifica quanto única – que possuí quesitos, dados concretos, DNA, cultura intrínseca - assumir-se tamanha responsabilidade sequer, que fará levar, de ânimo leve, aceitar-se compor um jurado de um certame de tunas. Só a responsabilidade deveria, por pura ética, afastar esta hipótese. Aliás, o ânimo leve com que regulamente se encara esta questão é a antecâmara da mais que provável asneira avaliativa.

Excluo naturalmente – e porque um jurado se quer equilibrado em várias vertentes que são pertinentes à cultura tunante – pessoas qualificadas musical e vocalmente, a par com pessoas do meio e que obviamente, procura tal mescla um upgrade ao aspecto meramente avaliativo. Uma coisa é convidar para um jurado um músico com provas dadas, outra é convidar o carola que é aficionado de tunas e por aí se fica. Sou grande apreciador de comida chinesa mas tal não me qualifica como potencial jurado de um Hell´s Kitchen em versão macaense. Vejo muito futebol mas a UEFA não me atribui a categoria de árbitro por essa razão somente. E como sabemos, um árbitro não é jogador ou treinador. E melhor se percebe que o fervoroso adepto que devora os jogos de todas as Ligas mundiais na televisão não é, por isso, treinador ou jogador de futebol.

No campo oposto, temos a ética a ser ferida de morte quando se convida para jurado alguém que, manifesta e sensatamente, deveria até recusar o mesmo convite, por manifesto decoro e ética, lá está. Já recusei inúmeras vezes compor jurados por manifestamente não ético e até por objecção de consciência e face ao que se me colocou então e caso a caso. Não me parece de todo aceitável que um antigo elemento de uma dada tuna componha um jurado de um certame onde a sua própria tuna está a competir, ainda que tenha feito parte activa da mesma no século passado. Nem coloco em causa a posição do dito cujo, admitindo a sua santidade quase Papal até, antes coloco logo a abrir é toda a credibilidade do evento em si mesmo que, desnecessária e puerilmente (ou até propositadamente…), mostra estar-se nas tintas para a ética daquilo que está a fazer.

Eticamente, um jurado na sua composição deve obedecer às mais elementares regras de bom senso, por evidentes até. A não observância do atrás dito é logo a abrir um atestado de e pelo menos, duvidosa credibilidade e antes disso, de perigosa colocação em causa de todo o evento competitivamente saudável como se pretende, supostamente. Já basta e porque dado incontrolável a própria natureza do ser humano, mesmo daqueles que estão habilitados em razão de matéria para a missão em causa; aliás, é precisamente por isso que o estabelecer de regras e critérios e sua estrita aplicação é importante, para assim reduzir ao máximo possível tudo aquilo que implica a subjectividade e gosto pessoal dos que estão habilitados a compor um jurado de tunas. Ora, se constatando essa natureza humana em pessoas habilitadas à função, naturalmente, imagine-se o que poderá (e ocorre) quando os jurados são compostos por pessoas manifestamente desadequadas e néscias para a mesma. É o potenciar do mais que provável erro elevado ao cubo, basicamente.

Um jurado não existe para penalizar, antes para premiar; não procura o erro, potencia antes o bem-fazer. Eleva o Ser Tuno e não outra coisa qualquer. Patrocina o essencial e descarta o acessório. Glorifica a musica da e na Tuna e não o que anda à volta do que importa realmente. Premeia a audácia com nexo e ignora a invenção arrogantemente contra natura. Todos nós temos algures – tipo a virtude, aquela coisa que está ali no meio mas que ninguém sabe definir em concreto… - uma noção de justiça. A par dessa noção deve existir outra e nestes contextos, o de isenção. Ora, como ninguém detém a exclusividade quer da Justiça, quer da Virtude, quer da Isenção, só resta em consciência reduzir os riscos da falta de todas – algumas ou mesmo até só uma – as características atrás citadas. Daí a importância de regras, acima das Doutas cabecinhas de todos nós, de critérios claros e objectivos tanto quanto possível em arte, aplicar os mesmos com isenção e rigor deixando de lado tanto quanto possível outros factores mais que humanos, até e com tudo isto, assegurar a ética mais do que necessária para a credibilidade de todos nós, ao fim e ao cabo.

Não há nenhum método infalível, que fique bem claro, seja em que tipo de avaliação seja. Aqui não haveria, pois, de ser distinto. Há, claro, injustiças. O que se vê aqui – e ao contrário de outras avaliações nos mais diversos ramos de actividade sejam quais sejam – é precisamente o oposto do que deveria ser: ao invés de refinar-se a base, vê-se é o destruir dos alicerces, ao invés de se ter cuidados preventivos, assistimos antes a cuidados paliativos ou nem isso até (“que se lixe, o importante é curtir!”). Ao invés de se ter regras, critérios e um jurado sério e a sério, não há regra ou critério algum e com jurados tão competentes para a missão como serão competentes os nossos partidos para nos tirar da crise, ou seja, nada. O cenário geral já foi pior, também o sei. Há desde há muito tempo uma pedagogia nesse sentido e que já colheu frutos a bem de todos, o que me congratula. Já há mais espírito crítico face a determinadas “coisas” que ocorrem amiúde. Já se vê certames “à rasca” com a argolada que meteram um dia. Mas também há ainda muita “tragicomédia” pré-anunciada. Eticamente desnecessária. Que só implica os promotores da mesma.

Toda esta “conversa em família” apenas visa quem se põe a organizar, não mais ninguém. É na raiz das coisas que a mesma conversa faz sentido. Porque, para os outros, é e será sempre subjectivo, isto ou aquilo, é da natureza humana, lá está. Fica ao sabor da ética ou falta dela de cada um de nós. Portanto, despiciente. Já todos nós fomos vitimas e beneficiados pela tal falta de ética. O que todos nós sabemos também é que quando a ética impera de base, diminui-se largamente as probabilidades de erro. E ao fazê-lo, é toda esta cultura que ganha com isso, não somente quem esteve ali, naquele evento, naquele fim-de-semana. Como o contrário sucede, quando alguém resolve “inventar” ou então nem isso por manifesta demissão face ao assunto, quem fica a perder somos todos nós, é a Tuna. Parece-me evidente que se a malta não se dá ao respeito, logicamente continuaremos a ser vistos de esguelha. Pode parecer um exagero meu e neste contexto. Mas à Mulher de César não basta parecer….


Post Scriptum: Numa altura do ano em que a nossa sazonalidade nos indica estarmos no meio do turbilhão festivaleiro, deixo o apelo derradeiro: Há material mais do que suficiente, publicado em vários locais na Internet, que auxiliam quem se propõe aventurar-se nestas coisas. Mas atenção, de nada vale o mesmo se, depois, ou se esquece dos papeis ou então se colocam taxistas e jardineiros a avaliar tunas....

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