A Aventura da Coerência do Clássico




Por muitas voltas que sejam dadas, o fundamental volta sempre, mais dia menos dia, à sua base genética. O Tempo pode trazer até dissidências, conflitos, formas de ver distintas mas o retorno após desvio até, ao ADN de nascença, acaba quase sempre por se manifestar.


A coerência - sempre dificil de manter ao longo de 20 ou mais anos - nunca foi um exercício fácil. Muitas de então perderam-se nos labirintos das “novas estéticas”, “meu-conceito-de tuna” ou até mesmo em outras identidades que não as que presidiram às suas fundações, então. Certo. Muitas foram oscilando entre o quase desaparecimento e uma intermitente existência meramente pontual dentro de portas, ou resumida a uma mesa de jantar uma vez ao ano. Certo.


Mas a verdade é que sobreviveu em coerência quem, apesar de tudo, se mantem ou resolve regressar à sua essência, ao respeito fundacional, ao seu ADN, mesmo que sob uma forma diferente, em upgrade até, mas sempre resolvendo-se no que toca ao conteúdo, naquilo que se apelida de Ser, seja X ou Y.


A verdade é que quem renegou o seu ADN, os seus principios, os seus fundadores, os seus traços identitários, mais não fez que ficar apenas com a placa em neon a piscar na montra mudando por completo o ramo do negócio, numa inversao completa e descarada de tudo aquilo a que a seu tempo se propôs, oferecendo, assim, aos outros, aquilo que se chama de contrafacção.


Quem regressa - apesar de tudo, do passar dos anos, das crises, dos tempos, enfim, de tudo - ao seu âmago, ao ser Ser, mais tarde ou mais cedo volta aos momentos que em tempos viveu, numa replay sempre coerente mas que não deslustra nem à história própria, nem ao presente que hoje consegue tal. Não sendo exactamente apenas por força dessa coerência que se volta a ser feliz no mesmo local onde já se foi, parece por demais lógico que resgatar a própria identidade é uma espécie de código postal para voltar a fazer aquilo que em tempos foi feito e bem feito.


Não há esta relação (a tal identidade) em algo que se auto-mutila, se desvia, se destroí por opção própria mesmo não dando sequer conta de tal; quem teve sucesso porque foi a seu tempo coerente, se hoje não o for apenas conhecerá a indiferença do insucesso. Quem se afunda nas trevas da insignificância apenas revela que não respeita o seu ADN, a sua história, os seus mentores, logo, o que os move serão outras motivações que não as genéticas, aquelas que os levaram ao sucesso então. Casos há que roçam a fraude, até.


Ainda recentemente a Tuna de Medicina de Múrcia provou cabalmente - e a vários niveis, note-se - a importância desta noção de coerência do clássico, do manter do rumo traçado à nascença. Por muito revoltos que estejam os mares e as marés, os marinheiros com rumo traçado nunca ficam à deriva: Mas tarde ou mais cedo chegam ao porto de abrigo que delinearam em tempos chegar, por mais ondas que tomem pela proa. Os outros serão sempre os outros, porque querem continuar à deriva, no fatídico embalo que os conduz ao inevitável naufrágio, porque renegaram os seus princípios, a sua Carta de Marear, o seu diário de bordo, os seus capitães, julgando no alto dos seus egos inflacionados estarem a caminho de uma qualquer coisa - quando apenas a caravela mete água.


Este fim de semana foi apenas um bom exemplo da coerência do clássico, do que a mesma pode trazer, do sentido lógico e da identidade própria, do respeito pelos principios, ideias e ideiais de berço, que configuram aquilo que, para mim, é cada vez mais o melhor que uma Tuna pode ter: Saber Ser Ela Própria. Quem o é colhe reais frutos. Quem não, colhe repetidas vernissages em circuito fechado, sujeitos à caridade de uma folclórica meia dúzia de alguns - que mais tarde ou mais cedo lhes falharão - o que apenas lhes prolonga a agonia, da qual nem consciência dela possuem.






O mais importante de uma Tuna não é o palmarés, não é o número de CDs gravados, nem os anos que tem de actividade: É Respeitar-se a Si Mesma. Quem o faz volta sempre a ser feliz nos lugares onde já o foi, conquista novos feitos, até. Quem não, Não: É um condenado à morte que rejubila por ver a pena comutada para prisão perpétua.




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