A Aventura do "Eu-É-Que-Sou-O-Plesidente-Da-Junta!"





Há que o dizer logo a abrir: Os que menos sabem sobre a Tuna são os Tunos.


E por uma razão muito simples de explicar. Emulam a sua própria vivência tuneril como sendo o Ser Tuno de forma genérica, deixando de lado, por desnecessário, qualquer outra contextualização - seja histórica, factual ou até sociológica - que não seja aquele tempo em que são, foram Tunos. Para esses, é a única coisa que conta.

É legítimo, convém referir, que cada um de nós condense a sua própria vivência enquanto Tuno e a interprete como sendo o Ser Tuno de forma genérica. Também o fiz/faço. Porém, essa legítima interpretação pessoal, de cada um, não deve servir para justificar desvios, incorrecções, interpretações à la carte daquilo que é de facto, a Tuna Estudantil. Essa contextualização é o próprio DNA da Tuna Estudantil e que, grosso modo, quase todos não observam. Ninguém é, por essa mesma razão, "obrigado" a chamar a um grupo motard da faculdade de Tuna, pela mesma razão que não se aplica a designação da expressão musical Tuna a um qualquer outro grupo musical. Há várias expressões musicais que são mais ou menos bem definidas e balizadas no tempo e no espaço. E a nossa própria vivência não pode, nem deve, servir de desculpa permanente para justificar coisas anacrónicamente erradas.


Percebe-se a imensa atracção quase magnética que o fenómeno Tuna ainda hoje recolhe junto da comunidade estudantil como forma de integração, interacção com os outros, afirmação colectiva até. Até aqui tudo bem. O que não se entende, por outro lado, é a má utilização da vivência pessoal de cada um para justificar o injustificável. Note-se que nada aqui interfere com qualidade artística: Há na história recente estudantil portuguesa grupos que nunca se afirmaram como sendo uma Tuna porque simplesmente não o são. Exemplo clássico a Orxestra Pitagórica. E já antes existiam grupos assim. Estudantes que fazem música não são automaticamente uma Tuna, nunca foram. Podem ser como podem não ser. E nada a obstar. O que não colhe aqui credibilidade é afirmar-se que se é uma Tuna quando o que se vê indicia tudo menos ser uma Tuna. E esta constatação não é nada mais nada menos que resultado da tal emulação da vivência de cada um de nós para a afirmação de um determinado enquadramento.


O Tuno português, ao proceder dessa forma, está a revelar apenas aquela coisa tão velha de 30 anos que é o ignóbil "meu-conceito-de-tuna", onde caberá, por consequência, um grupo motard, um de forcados amadores ou um grupo de xadrez. E é aqui, nesta amplitude de frequência tão libertina quão néscia, que se revela o evidente: O que menos sabe sobre Tunas é o Tuno. Há 30 anos atrás não existiam meios, internet, FB, para os de então, o que levou a interpretações tão românticas quão néscias. Havia "desculpa". Hoje, não, de todo. Há muito por onde confirmar, o que não falta é informação credivel para consulta.


O cidadão normal que nada sabe sobre Tunas tem uma vantagem, portanto, acrescida: Escuta, vê, opina e depois, se for corrigido, informado e avisado, modela a sua percepção sobre algo que não conhece. Ou seja, reconhece tacitamente a sua ignorância sobre o tema, procurando por isso, saber mais e melhor, evoluíndo no seu conhecimento sobre o tema porque predisposto a essa evolução. É norma em qualquer actividade que nós desconhecemos procedermos dessa forma caso tenhamos abertura, interesse e modéstia para aprender algo sobre. O Tuno ao emular a sua própria vivência caí num erro fatal: Cristaliza a ignorância refugiando-se no "meu-conceito-de-tuna", o que o coloca num patamar abaixo do simples curioso de ocasião sobre Tunas, porque preso, refém, de si mesmo. Fatal. Pior que não saber é achar que se sabe, nada sabendo. 


Dito isto, concluí-se que volvidos 30 anos grosso modo, continuamos a assistir a tal "filosofia" que indicía interpretação ad-hoc, a metro, a la minute, do que é uma Tuna, quando, por mais que provado, estudado e fundamentado, se sabe hoje claramente o que é uma Tuna e no caso, estudantil. É como se Copérnico fosse contrariado na sua teoria que diz que os planetas giram em volta do sol - provada pelo mesmo cientificamente - todos os dias por todos e cada um de nós, com uma facilidade atroz que indicia antes presunção, arrogância e consequentemente, ignorância. Pior, quando cultivada sob esse imenso telhado que dá para cobrir tudo intitulado de "meu-conceito-de-tuna". O Tio Herman caricaturou esta postura de forma brilhante com o teaser "eu é que sou o Plesidente da Junta!".


Não se discutem liberdades, quanto muito, libertinagens. Se se pode? Tanto pode que há. Nem vou por aí. Mas isso não significa que não seja legítimo apontar o dedo, corrigir profilaticamente, explicar porque sim e porque não. É que, aliada a essa postura adolescente do "eu-é-que-sei" ainda há o fantástico apontar de dedo fulanizador a quem de forma correcta, elevada e séria mostra a fraqueza dessa "teorização-a-gosto", o que prova antes de tudo a fraca cultura tuneril nacional, para lá da inerente arrogância que nem sequer aceita o mero reparo. Para piorar, detêm-se na forma e nunca no conteúdo. Para terminar a faena em beleza, fulanização por falta de argumentos sólidos. Arroz.


Infelizmente, é a verdade: Os que menos sabem sobre a Tuna são os Tunos. Deveria ser ao contrário. Aprender nunca deveria ser visto como um acto menor, antes pelo oposto. Em universitários então, tal postura é inexplicável, até, seja sob que ponto de vista seja.

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