A Aventura do Kim






Preferi deixar passar uns dias. É sempre uma notícia que choca.


Mais a frio:


Conheci o Kim Mendes nos anos 90, aquando das primeiras idas bi anuais a Braga com a "minha" TAULP, então. O Kim rapidamente cativava um comum mortal com aquele fraseado rápido dele a puxar sempre para a graça, para o chiste, para o trocadilho, que - e não raras vezes - levava a reboque a critica cirúrgica não destrutiva, bem pelo oposto, a mais positivista possivel: Ele era um eterno lutador pelo que achava estar certo, correcto, justo.


Recordo aquela do "quando fores à cantina em Santa Tecla leva uma moeda e um cigarro, assim, se fores assaltado despachas isso num instante....!" , numa clara alusão à falta de segurança que - então, não sei hoje se sim se não... - os alunos da Universidade do Minho sentiam quando iam à cantina naquela zona da cidade. Não era criticar por criticar por regra: Era ir um bocadinho mais além. O Kim era, por isso, uma personagem peculiar, única, frontal, justa.


Privei de perto uma década com ele. Era presença mais ou menos assídua, então, nesse tempo, à noite, na sala do Jogralhos, ali" ao pé do jardim do tabaco" - reportando-se à máquina de tabaco que, então, estava à porta da sala. Muitas impressões trocamos, umas mais leves, outras mais a sério, sobre o mundo tuneril. Era uma visão que, de fora - não era Tuno - via o fenómeno por dentro - por ser Jogral. Permitiu-me, por isso, ter à disposição outras visões que, ainda hoje, colhem por pertinentes. O que revela o olhar holístico que o Kim tinha destas coisas.


Quando levei o "Noite de Tunas" para a Rádio Universitária do Minho - graças ao Kim, também -  a primeira emissão foi, precisamente, com ele e com o Norberto - forte abraço, amigo Norby.... ! - naquela que considero uma das melhores emissões que fiz em anos de tunas na rádio.


Já então o Kim dizia algo como isto: "O formato dos festivais é demasiado espartilhado, rigoroso, fixo; é chegar na sexta, tocar em palco, sábado há pasacalles, toca-se à noite, entrega de prémios, duas festas e está feito! ". Já escrevi sobre este tema várias vezes e, na verdade, o ponto de partida é este quando se fala no modelo de festivais em Portugal. E várias outras perspectivas deixou, então, em outras intervenções na rádio, pertinentes, inteligentes, deveras interessante. Era mais que um mero Jogral, o Kim. Ele pensava estas coisas - num tempo onde raros eram os Tunos que o faziam.


Foram anos gloriosos, esses, em que em palcos e em estúdios ou na sala do Jogralhos, privei como o Kim, o Norby, os Zés - da Póvoa e da Maia - and so on. Tempos onde raramente se falava sobre tunas, se pensava a tuna, se olhava a tuna porque demasiado ocupados andávamos a tocar umas malhas, a beber uns copos e a confraternizar entre todos - e ainda bem!


Depois quis a vida que os caminhos de cada um tomassem rumos distintos. Já não via o Kim há uns 20 anos, talvez pouco menos. Ia tomando conhecimento, a espaços, de algumas coisas mas - confesso o meu deficit - nunca fui beber mais um copo com ele. Erro meu.


O meu choque resulta da imagem que tenho dele, a última, desses tempos gloriosos, precisamente. O hiato temporal foi demasiado longo e resta aquela imagem de festa, riso, lenço amarelo ao pescoço e jola na mão. Por essa razão se mantem o choque, hoje.


Um dia a malta vê-se, Kim. Há umas quantas teorias que quero discutir contigo, na boa. E umas gargalhadas e trocadilhos para fazermos juntos.....


Comentários

Sara Lucas disse…
Para mim foi igualmente um choque. Confesso que quando soube estava no carro pronta para regressar a casa depois do trabalho e por algum tempo não conseggui pôr o carro a trabalhar. Embora não tenha privado assim tanto com o Quim, as memórias são fortes. Ele sempre foi uma figura marcante. Obrigada pela homenagem. Gostei de ler este texto.