A Aventura da Representatividade Tuneril






Penso nunca ter aprofundado este tema aqui. Uma estreia, portanto - o que é, pelo menos, de assinalar...


Já me tinha deparado, em tempos idos, com mais uma "tradição" de 3 quartos de mês, sem qualquer fundamento lógico, racional e muito menos histórico:


A questão da Representatividade da Tuna. Por partes.


Reza a lenda que e cito "A Tuna representa a sua Universidade/Faculdade/instituto/Cidade/Vila/Aldeia/etc". Aparentemente, essa vinculação existirá casuisticamente, nada obsta a tal generalização abstrata em causa - porque , efectivamente, o é. Exemplo: A Tuna da Universidade X representa a sua Universidade - e cidade, região, etc. Certo.


Contudo, há um mas - e, pelo menos, um.


A Representatividade, regra geral, a que se alude - parando-se para pensar e analisar com frieza, distanciamento e objectividade - é meramente informal, por associação também ela informal, pois resulta quase sempre (excepções haverão) da mera vontade de estudantes de uma dada instituição, a dado momento, em criar uma Tuna - ou um grupo motard, de xadrez ou de costura. Convém referir que a Tuna é uma expressão musical que nasce, em Portugal, primeiramente, fora do seio universitário, ou seja, nem sequer tem - o foro universitário - a primazia neste apartado.


Traduz-se: Os organismos formais da Universidade não propuseram *, em primeira instância, aos seus alunos, a criação de uma Tuna: Foi precisamente ao contrário.


E isso muda tudo na presente análise. Se é de mediana percepção que foram os alunos - como ocorreu no boom de fins anos 80/90 do Século XX - a criarem os seus grupos, onde a Tuna surgiu de forma quase imperativa, não será menos verdade que tal NÃO ocorreu por iniciativa das Universidades/congéneres mas sim pela capacidade associativa dos estudantes que, então, criaram Tunas. 


Mais: Relembra-se - e salvaguardam-se novamente as raras excepções - que a esmagadora maioria das tunas fundadas após fim anos 80/inícios 90 em Portugal NÃO são, elas mesmas, instituições formais, associações legalmente formadas (e entretanto algumas que não o eram assim se tornaram, numa clara inflexão que explica esta "Aventura", até) e, por isso, sem qualquer personalidade jurídica, o que as torna, à luz da Lei, algo que não existe. O mero uso do nome da instituição que alberga a Tuna NÃO configura qualquer carácter de facto e perante a Lei, ou seja, não se trata de um grupo formal por essa simples razão.


Traduz-se de novo: A ligação de uma tuna à instituição de ensino superior que a acolhe NÃO é uma formalidade, nem tem valor como tal, apenas subsidiariamente acolhe a Tuna que, por sua vez, usa o nome da instituição onde os seus componentes estudam porque estes assim o entenderam e, em simultâneo, porque a instituição assim o tolera - ora por interesse pontual ou mesmo constante, ora por razão nenhuma.


A Representatividade da tuna é - e no caso face à sua instituição de ensino respetiva - conclui-se, além de conjunctural, algo altamente volátil, sem fundamento legal de facto, que apenas usa uma denominação comum porque, precisamente, alberga um grupo de estudantes da mesma instituição que gostam de música. 


E é tão pertinente esta análise concreta que encontramos na história recente de 30 e picos anos pós boom exemplos que, por práticos, atestam a validade da mesma. A Tuna Bruna, da Figueira da Foz, não deixou de existir por força do encerramento da instituição de ensino que, originalmente, a albergou. Que melhor exemplo se poderia dar neste contexto?


Quantas tunas de universidade/faculdade existem em Portugal sem qualquer apoio, vínculo ou até relação directa ou indirecta com as suas instituições? Atrevo-me a dizer que serão uma silenciosa maioria. Ora, que representatividade é esta que, além de não existir formalmente, nem sequer existe informalmente? 


Quantas tunas de maior amplitude - as que vão mais além das suas instituições e que existem desde o boom - não são, elas mesmas, associações legalmente formadas? Quem se atreve a dizer que são "menos tunas" do que as outras que, mesmo usando nomes das suas instituições de ensino, de facto, legalmente não existem?


Quem pode dizer que a Tuna Bruna - Tuna Universitária da Figueira da Foz, é hoje "menos tuna" porque não representa uma universidade?  Mais: Quem é o néscio que afirma tal ? - bastando ler um pouco para perceber a realidade.


Mais um mito dos anos 80/90 que entrou em algumas cabeças e que teima em sair, perante o indelével peso que a realidade possui. O que a História nos diz, comprovadamente, é que uma tuna universitária é formada por estudantes ou ex-estudantes universitários. Até mostra que foi formada por não estudantes, pasme-se  - a Tuna Universitária do Porto apenas em 1937 passa a ser formada EXCLUSIVAMENTE por estudantes. E mais exemplos existem que atestam essa noção. Quem somos nós, hoje, para vir inventar "cenas" que apenas servem para justificar o injustificável?


Querer ser mais papista que o Papa foi um dos perniciosos, por ignorantes, legados que a Praxe mesclada nas Tunas deixou. Misturou alhos com bugalhos, criou "mitos", invenções, falsas noções, tretas, que ainda hoje - pese a vasta informação disponível - persistem em, aqui e ali, surgir à tona. Os tais "Opinólogos".


Em última análise, queira-se ou não, a Representatividade de uma Tuna é aquela que a mesma se autoatribuí - e não o que terceiros "opinam" ou deixam de "opinar"  - e a sua denominação aquela que os próprios pretendem ter e que a Lei permite - conheço pelo menos um caso em concreto de que uma dada denominação, antes usada mas não registada, que foi posteriormente por outro agrupamento legalmente firmada.


Se uma Tuna legalmente constituída por estudantes ou ex-estudantes usar uma determinada terminologia no seu nome, quem tem o poder de impedir ou autorizar essa terminologia é o Ministério Público - e não o "zé das couves", frequentador habitual de corredor de teatro em noite de festival de tunas que não sabe nada disto, nem quer saber.


E a História está repleta de Tunas que, mesmo constituídas informalmente - como são 75% das tunas portuguesas e umas 99% das espanholas - não carecem nem de "permissão" de terceiros nem de representatividade informal - sendo que esta NÃO é monopólio de ninguém, nem na instituição de ensino X, nem na cidade Y.  A Tuna de Segreles de Porto Rico teve, em tempos, um cartão de visita, que dizia "Tuna de Segreles, Inc". Parece que ninguém se importou, então, com a dita representatividade da Tuna de Segreles - como ninguém se importa, por cá, tratando-se de tunas espanholas. Também há quem jure a pés juntos que as quarentunas não vão a concurso em festivais mas, afinal, vão. 



Achar-se que aquela Tuna é "menos" ou "mais" tuna por força da denominação que tem ou da forma como se constituiu é apenas e só, além de dogma néscio, uma profunda parvoíce que promove apenas divisão entre tunas  - parvoíce que, aliás, as novas gerações (e mais uma vez se assinala) desconhecem por completo, precisamente porque mais focadas na lógica, bom senso e, sintomaticamente, na verdade histórica.


O absurdo é de tal ordem que ignora olimpicamente - e diria, até, convenientemente - a essência da Tuna: A Música.


*  haverá raras excepções delimitadas historicamente


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