A Aventura da Postura em Cena


A propósito de uma reflexão colocada noutro forum surge esta Aventura da postura em cena. Uma vez mais - e em jeito de introíto, apenas - dizer que a preocupação com o palco, com a cena, continua a ser, ao que se percebe, uma factor de importância que eu considero mas não extra-valorizo, ou seja, continuam a ser debatidos aspectos mais ligados ao palco do que propriamente à Tuna em si enquanto tal, o que não deixa de ser revelador por um lado, de uma certa preocupação a meu ver desmesurada com um momento em particular mas por outro lado, reflexão pertinente desde que com peso e medida e no contexto mais amplo do que deve ser uma Tuna e agora aqui, na situação de palco, de cenário. Sinais dos tempos, diria eu, que também me "preocupo" com essas pequenas grandes nuances quanto Tuno mas que não deixam de ser reveladoras - pela extrema importância que lhe é dado - de algum desnorte face ao essencial em prol do parcial, por muito importante que seja esse mesmo parcial.

Bom, passada a nota prévia, vou abordar então a temática sectorial quanto ao palco, a postura em cena. Antes de mais, dizer que não é uma preocupação de hoje as grandes entradas, a elaboração de uma cénica a condizer com o espectáculo da Tuna, um cuidado com a apresentação; desde sempre ela existiu e também aqui hoje se vê repetições de repetições nos modelos utilizados actualmente, fazendo lembrar alguém que dizia que anedotas só há umas 5, todas as outras que existem - milhares e milhares - mais não são que repetições polidas e recauchutadas dessas cinco anedotas "de sempre". Há momentos memoráveis e registados até de grandes interpetações cénicas a "embrulhar" as actuações de Tunas e desde há muito tempo, praticamente desde o ressurgimento das Tunas universitárias em Portugal. Por aí, nada de novo se poderá dizer, pois hoje apenas assistimos ao inevitável replay de algo já anteriormente feito e em várias temáticas até, no passado. Vários videos o atestam.

Lembro aqui nesta Aventura e a titulo de mero exemplo, que o único programa de Televisão dedicado exclusivamente à Tuna universitária feito alguma vez em Portugal - o Effe-Erre-Yá - tinha na avaliação da actuação da Tuna e no seu compto geral, 15% da avaliação da mesma assente na então chamada "prova académica", deixando os restantes 75% para a musica propriamente dita. E basta só este exemplo para se perceber - e pelo impacto que o programa teve então no todo do fenómeno - o rasto de creatividade e de importante inovação que até hoje se denota frequentemente. Ou seja, é de sempre e mais antigo que a Sé de Braga, passo a expressão popular, esta vertente mais cénica e dita académica que a Tuna denota hoje em dia e que ao que parece, assume uma importância - a meu ver, desproporcionada como disse acima - no elenco do guião a apresentar em palco pela Tuna hoje em dia. Claro que há quem se limite ao tradicional "bota e bira" ou ainda assente toda essa estrutura de embrulho da actuação no "one man show" dos quais temos alguns que hoje até mesmo comediantes com projecção televisiva na área do humor ou o mais conhecido "stand up comedy". Dou dois exemplos conhecidos: O João Seabra - da Azeituna - e o João Cabo da Tuna da Universidade Católica Portuguesa - Porto, dois exemplos claros que mostram como pode ser bem embrulhada uma actuação de uma Tuna em palco com a presença carismática de um só Tuno que faz as despesas dessa vertente cénica em claro beneficio de um todo. Aliás, todas as Tunas acabam por ter o seu "one man show" - ou "one woman show" - ao longo da sua existência temporal e isso certamente não será por acaso.

Os espanhoís, com 5 séculos de avanço este Negro Magistério, têm há muito um apartado, um prémio - e no caso do palco em concreto - que se cinge precisamente a isso, a chamada Mejor Postura en Escenário, que mais não é do que isso mesmo, premiar - logo, pressupõem-se em competição - aquela Tuna que melhor tirou partido do apartado visual, do contacto com o público, com a empatia que emana ou não, com a simpatia que irradia ou não, com a forma como se apresenta até na parte relativa à estética Tunante (assisti em meados de 1994 num certame a sul a uma cena entre Tunos da mesma Tuna que, num ensaio prévio à subida a palco, tiveram nesse mesmo ensaio o cuidado extremo de verificar se TODOS os seus componentes tinham a Capa devidamente posta às costas como manda a Santa Tradição e, curiosamente ou não, para lá de musicalmente magistrais então, foram precisamente a Tuna vencedora desse certame, com um cuidado a esse nivel a anos-luz de todas as restantes incluíndo a Tuna onde então eu exercia este Negro magistério; certamente que não foi por acaso que ganharam e não só pela musicalidade demostrada seguramente).

Portanto, o tema pertinente hoje lançado á mesa das negociações é tão pertinente como o é debater a inflação homóloga, ou seja, é questão sempre na ordem do dia e não de hoje certamente, de Tuna que se preze desse epiteto. A lógica espanhola de organização dos apartados a valorizar é distinta da nossa - nossa que herdou directamente deles os nossos apartidos valorativos, note-se - e mais extensa e mais particular ainda, sendo que o prémio Mejor Postura en Escena é nada mais nada menos que a prova disso mesmo, pois por cá - salvo ponderosas excepções - esse prémio não existe sequer nos certames realizados em Portugal sejam eles nacionais ou internacionais. Mais afirmo, a portura em cena é um dos itens avaliativos para os 3 prémios cimeiros ou para o prémio cimeiro, sendo isso mesmo, um iten a avaliar -e muito bem e cada vez mais deveria ser avaliado de facto e com peso concreto, diga-se - num todo mais amplo que consiste na avaliação dos prémios cimeiros; mais afirmo, deveria ser iten de clara valorização para escalonamento final dos 3 prémios cimeiros porque - e como bem dizem os espanhois - saber estar em Tuna enquanto Tuna é algo fundamental, essencial até, para a clara distinção entre o que é uma Tuna e um grupo de estudantes vestidos da mesma maneira que tocam instrumentos (cada vez menos) de cordas. Se este apartado fosse devidamente ponderado e analisado, muitos resultados finais em certames seriam diametralmente opostos ao que se assiste amiúde até, seguramente mesmo muito distintos. Aqui concluo que os Espanhois têm toda a razão e que mais uma vez, estamos na posição de alunos e não de professores (ao contrário de alguma "mitologia tunante urbana" que por aí grassa).

O preparar de um evento de palco é de facto importante e não quero - nem o fiz nunca, tão pouco - desvalorizar face ao todo; as apresentações preparadas como deve ser, com trabalho efectivo que é notado por todos, com clara preparação de casa face ao local que nos recebe, com claro envolvimento com o publico, com noção de timing e a evitar crasses temporais entre temas ou momentos, é algo que é obviamente importante e temos por cá mestres nessa arte num leque que vai do "one man show" até ao levar de um barco para palco e encenar toda a actuação em torno de uma viagem marítima, temos felizmente de tudo e de há muito tempo para cá, note-se novamente. Não há aqui descoberta da pólvora. Fala-se muito na pretensa originalidade de alguns que fazem isto e aquilo de forma pouco ortodoxa; até esses que hoje professam a originalidade como motivo maior para o seu desempenho estão a copiar algo que antes viram noutras Tunas, numa miscelânea de influências que por vezes resulta mas noutras faz apenas com que se desvie a actuação, ou seja, o embrulho acaba por ser mais importante do que a prenda de facto; ora, se num certame o embrulho é um iten avaliativo entre tantos outros para os prémios cimeiros, já se percebe muita coisa que vai ocorrendo aqui e ali;

Juris desprevenidos ou de ocasião caem com extrema facilidade nesse logro, mais digo, até Jurados com experiência caem. Tunas que pura e simplesmente não se trajam em palco durante a actuação toda, de fio a pavio, porque assentam a sua actuação num espaço cénico (bonito, até pode ser mas para outras ocasiões) que não contabiliza a falta do devido trajar de estudante e/ou de Tuno não deveriam ser premiadas sequer, antes penalizadas pela falta precisamente do elemento estético identificativo de uma Tuna. Pior, muito menos quem se traja mal e de forma declarada e anunciada aos sete ventos; a esses uma desclassificação é mais que justa porque profilática para o todo do fenómeno. Ou bem que é um certame de Tunas ou bem que não o é. Culpa de quem? Jurados e organizações levianas, ponto período. Já o disse antes: a liberdade de uns em se trajarem mal ou não trajar sequer não pode colidir com o cumprimento de um factor essencial em tunas, o cumprimento das mais basilares regras Tunantes: Trajar bem não é sequer sujeito a contraditório.

A facil acessibilidade a meios audiovisuais que hoje disfrutamos pode ser um excelente meio de embrulhar a actuação e quando usado com ponderação, bom senso e acima de tudo, nitida classe no que é feito e difundido publicamente. Nada a obstar, também os utilizo aqui e ali até. Potenciar os meios disponiveis quer humanos quer outros é sinal de vitalidade da própria Tuna enquanto instituição, logo, é de louvar. Mas tudo isto atrás dito só faz sentido se utilizado com respeito pela Tuna e pela Tradição Tunante, caso oposto cheira a claro oportunismo saloio onde quem cai mais saloio é.

Há efectivamente na parte concreta da apresentação em palco, uma serie de clichés que estão gastos porque useiros e veseiros fomos todos um dia neles. "O proximo tema é..." ou o inevitável " esta Serenata é dedicada à Joana e à Maria, nossas en(guias) " e blá blá blá é obviamente a solução óbvia, passo a redundância propositada. Mas não será menos verdade que é ainda é bem melhor isso do que algumas coisas ditas supostamente inovadoras que por aí vão caindo em palco travestidas de ultima moda Outono /Inverno para "otário" comer como sendo coisa "académicamente inovadora": Mil vezes o triste e enfadonho Pierrot do que o palhaço novo rico que deita fogo pela boca e pega fogo ao palco. E a "malta" aplaude!!!!! Seria de rir se fosse esta metófora apenas e tão só uma metáfora.

Outra questão que entronca nas anteriores: o público efectivamente (o desprevenido, onde muitas vezes está o Jurado também) distrai-se das gralhas quando outros factores intervêm na actuação. Resposta dada acima: Se é um iten de valorização o embrulho, então há mais a valorar e a contabilizar. Se o exagero neste embrulho é de tal forma que ofusque os restantes itens, então será algo que requer ainda mais atenção por parte de quem vê e avalia e não factor para o oposto, ou seja, é quando há mais embrulho que o Jurado deve estar ainda mais atento ao resto e não o oposto como acontece frequentemente.

Postura em cena: Muito mais haveria por dizer. Mas francamente, nesta fase do panorama, este tema tem a sua importância certamente muito particular e pontual; mas seguramente que a sua importância para o todo do fenómeno tunante é a mesma que têm os brindes do Jumbo para o Produto Interno Bruto nacional, ou seja, nenhuma. Antes de se ver o certame como importante há que ver a importância maior e superior da Tuna enquanto tal. Visse eu tanta escrita sobre a Serenata, p.ex, como vi sobre este tema e calava-me. Já. Mas não. A postura em cena e alguma preocupação desmesurada sobre a mesma faz-me lembrar aquele condutor que para não pisar o traço contínuo da estrada matou a velhota na berma....

Post Scriptum: Sugiro melhor. Um prémio para precisamente o oposto, Melhor Postura FORA do palco.Muito me haveria de rir.

Comentários

J.Pierre Silva disse…
Subscrevo por inteiro.
No fundo, existe uma origem para esta bola de neve: falta de um padrão transversal, de regras por todos observadas e cumpridas, a que acresce a necessária auto-regulação.