A Aventura do Franchising de Tuna

Os sintomas da actual crise financeira mundial começam efectivamente a chegar à Tuna ou pelo menos - e em rigor - ao ambiente dito tunante.
Começam a surgir na internet alguns sites deste género - http://www.tunagranada.com/ , http://www.tunamalaga.com/ ou http://www.tunadesantiago.com/ que por si só atestam de forma cabal muita coisa desde logo.


Começo pelo apartado de um dos seguintes sites acima que diz e passo a citar: "es una iniciativa empresarial formada por 4 tunos con una amplia y larga experiencia.....consiguiendo fidelizar nuestra clientela....Nuestro principal objetivo es la satisfacción del cliente " (fim de citação).


A semântica comercial é clara e digna de um qualquer negócio de âmbito comercial. São usados teaser´s publicitários equivalentes a um qualquer outro ramo de actividade produtiva que fornece, e no caso, serviços. A sua proliferação actual - embora não seja de hoje este fenómeno de comércio da arte tunante - começa a assumir laivos de autêntico franchising, procurando como única contrapartida o dinheiro, ponto período, num mimetismo de alguns exemplos pontuais.
Há que ver isto sob várias vertentes e desde logo a 1ª a reter será a prostituição de uma arte secular que na sua génese sempre soube lidar bem com o aspecto financeiro - o parchear, a sopa boba, a subsistência, etc - sempre dentro de uma lógica tradicionalista.
Parece inequívoco que e usando os casos de estudo acima, o que move os franchisados é unicamente o dinheiro e não a difusão de uma cultura enquanto tal, a sua representação cultural, a sua história enquanto tal. Não ponho sequer em causa o gosto, arte e engenho dos seus intervenientes; seguramente serão excelentes executantes musicais mas mais nada. Tunos não são e assumem-no desde logo - o que já lhes dá uma clara vantagem face a alguns que - até por cá - coexistem e que nem isso conseguem assumir.
Poderão alguns dizer que - e mais uma vez lá vem a "teoria dos tempos" - estes senhores apenas se limitam a fazer às claras o que as Tunas de facto fazem de forma velada. Pois acontece que a forma velada que as Tunas tradicionalmente usam para subsistir, independentemente dos tempos, é uma das características inatas da Tuna desde logo. Foi e é completamente diferente confundir-se a subsistência da Tuna e dos seus elementos enquanto tal com um negócio comercial dito de tunante porque no 1º caso, o que a move não é o dinheiro em si mas sim uma forma de Estar e Ser que quando faz uma Serenata espera como retorno um sorriso ou uma lágrima e não um cheque; Estamos a falar de posturas e coisas absolutamente distintas. Na Tuna o dinheiro serve para a mesma se poder mover unica e simplesmente na prossecução dos seus naturais e genéticos objectivos; nestes franchising´s o dinheiro os move pois não tocam nem cantam em troca de um sorriso de uma Dama, de um prato de sopa ou até de umas "jolas" e um presunto. São demasiadamente claros nos seus intuitos para que não restem dúvidas, para que não restem confusões entre a Tuna e eles - por muito que da Tuna em sentido lato se sirvam para rechear tão só e unicamente a sua conta bancária.
A natural atracção que o folclore tunante exerce ao incauto turista estrangeiro - e até nacional - serve como potenciador - a par com a crise, mais a de valores do que propriamente a financeira - destes fenómenos comerciais travestidos de Tuna. Facilmente se entende porque pululam grupos deste género e não só de agora, note-se.
Outros poderão dizer ainda: mas qual a diferença entre uma Tuna quando cobra honorários por uma actuação e estes grupos? Resposta uma vez mais no plano moral e não material. No caso da Tuna de facto cobra honorários por duas razões; subsistência do próprio grupo no pressuposto de os honorários cobrados irem directos para o cofre associativo, de todos, potenciando a actividade futura da instituição. No caso dos franchisados a única - e basta - certeza que cada um dos seus "comerciais" tem é que parte dos honorários entra directamente no seu próprio bolso, não restando nem mais uma única razão objectiva para darem o corpo ao manifesto. Na Tuna tanto se toca para o mais faustoso dos ricos como para o mais pobre pedinte e com a mesma graça, alegria e postura; no franchising só se toca para o mais pedinte dos pobres contra documento prévio de quitação por contraprestação de serviços.
Finalmente um alerta: Nestes franchisings é o dinheiro o único "mobil do crime" e pelo menos tem um mérito desde logo; é claro como água o seu intuito: Lucro pessoal. Há franchising´s ditos tunantes que têm outros motivos por trás - que não os pressupostos geneticamente tunantes - e que não se comportando exclusivamente de forma comercial encerram em si outro tipo de comportamento desviante, usando a Tuna em sentido abstracto, resgatando à Tuna o que de melhor ela oferece (vivências, ambientes, etc) e negando o que não lhes interessa de todo resgatar à Tuna (correcto comportamento, trajar, tradições, praxis, etc).
Comparando estes ultimos com os franchisados acima, é como comparar um arrumador de carros que os risca se não tiver uma moedinha com o Sr. Madoff que ataviado de fato e gravata de seda conseguiu enganar meio mundo dizendo-se o que nunca foi, mostrando assim o que de facto ele é. Entre a franqueza de um negócio - por muito promíscuo que seja - e tentar destruir-se subrepticiamente por dentro uma Tradição secular com invenções, negações e reformulações fantasiosas, mil vezes a 1ª opção ; Ao menos esta é clara. Basicamente, é a - pequena grande - diferença entre uma prostituta e uma alternadeira...

Comentários

J.Pierre Silva disse…
Era expectável que isso viesse a suceder, mais cedo ou mais tarde,e não necessariamente por causa da crise económica.

A Tuna sempre foi muito apetecível a diversos níveis.
Este é mais um.

Numa terra de ninguém onde a tuna é de todos e não é de ninguém, é óbvio que alguns oportunistas e, neste caso, alguns gananciosos, se aproveitem para lucrar.

Quando a tuna é sustento de alguém, deixa de ser tuna. A tuna é sustento dela própria e sustenta-se na gratuidade e altruísmo dos seus componentes.
Os tunos servem a tuna, mas quando se servem delapara este fim, estamos perante uma putuna.

Bem visto, caro amigo. Um grande artigo.
Eduardo disse…
Meu caro:

é a eterna questão - o dinheiro é um pretexto para... ou um fim em si?

Ambos sabemos a resposta, mas convém que fique registado preto no branco - ou, numa linguagem mais cibernética - «0 no 1»:

o dinheiro terá de ser sempre um meio para se poder alcançar um fim: um meio para que o tuno tenha força suficiente para se manter de pé (em todos os sentidos...).

O que estes senhores estão a fazer é transformar a tuna num meio para atingir um fim: o dinheiro.

Esta inversão é inaceitável. Poderá ser lícita à letra da lei, mas é imoral a qualquer título.

Abraço!
Músicas disse…
Lá está mais uma vez... que podemos fazer nós para acabar com estas situações meus caros??

Podemos denunciar a quem?

Há sempre alguém a querer prostituir-se, e outra alguém a querer pagar à prostituta...