A Aventura "Patrioteira"

Há efectivamente muita informação deturpada, culpa quiçá dos maravilhosos anos do "boom" tunante. E pior que isso, subjacente a essa noção errada e deturpada está uma noção "patrioteira" que pretende(u) apenas vincar uma determinada linha a soldo de uma pretensa representatividade popular em exclusivo a caber às Tunas universitárias e que andou em voga pelos anos 90 e chega, aqui e ali, até aos dias de hoje.

A ver se nos entendemos definitivamente. Não cabe, nunca coube à Tuna universitária nacional a exclusividade da difusão e/ou defesa da cultura popular portuguesa e sua música; isso coube, cabe e caberá a Ranchos Folclóricos, Grupos de Música Popular Portuguesa, a Tunas de âmbito popular e por aí fora. A Tunas universitárias não cabe em exclusivo essa representação, não é de todo a única fonte cultural presente e desde sempre, não é função primeira da Tuna Universitária portuguesa só, repito, só, tocar música portuguesa. Isso é uma falácia historicamente provada e comprovada, porque renega a matriz ibérica e a forte influência do fenómeno espanhol, onde a Tuna universitária nasceu, deve-se notar. Somos Portugueses mas somos Tunos universitários, não somos os "Vai de Roda" ou a "Brigada Vitor Jara".

Com isto dizer que nada invalida à Tuna universitária portuguesa - e ainda bem - a reprodução e defesa de temas populares portugueses ou mesmo exclusivamente nacionais. Contudo, essa escolha não pode ser vista pela óptica "patrioteira" mas antes sim pela bem mais saudável lógica patriota, o que aceito pessoalmente e entendo. A Tuna universitária é um fenómeno ibérico, é uma cultura estudantil própria e há N, repito, N, relatos historicamente documentados de temas espanhoís tocados por Tunas universitárias nacionais e em menor grau, certamente, o oposto.

É necessário perceber - e com isso sair da lógica actual e entrar na lógica de por exemplo finais do Século XIX, inícios do de XX - que a Tuna de cariz universitário em Portugal vai beber ao exemplo espanhol congénere praticamente todos os seus traços identificativos; naturalmente também a música. Até por motivos históricos os espanhoís sempre tiveram grande dificuldade em falar - e cantar - outras línguas, quer por força da própria história de Espanha e sua formação - várias autonomias e em certos casos, nem regiões são mas sim países diferentes subjugados a Castela, que sempre tentou pela cultura, logo, pela língua, impôr-se, logo, o castelhano sempre foi protegido face ao basco, catalão ou galego e numa lógica de unicidade nacional espanhola onde co-existem os casos que conhecemos. É precisamente por essa razão que , por exemplo, todos os programas de televisão estrangeiros emitidos pelas televisões espanholas são dobrados e não legendados; Também por isso é que as Tunas universitárias holandesas cantam todas em castelhano. A protecção histórica do castelhano pelos espanhoís - de Castela e Leão, entenda-se - sempre foi mais por receio do que propriamente por naturalidade, ao contrário da língua portuguesa. Por isso mesmo a Tuna universitária no País Basco é algo rara de se encontrar e por muitos bascos vista como uma expressão do centralismo de Castela, de Madrid. Por tudo isto é que só em Espanha os Rolling Stones podem ser os Piedras Rolantes.

Não se pode ser "patrioteiro" nestas coisas, sob pena de se cair num ridiculo que a ignorância subsidia. A História diz-nos que é normal, natural, frequente até, Tunas universitárias nacionais cantarem em castelhano. Sem prejuízo de sendo Portugueses, cantarmos em Português naturalmente. Não me sinto por cantar em castelhano menos Lusitano que outros que só cantam em português. E muito menos me sinto menos Tuno por isso. Patriota sim, "patrioteiro" dispenso. O tempo da Padeira e do Tratado de Tordesilhas já lá vai. Mais, já houve Tunas universitárias portuguesas a vencer certames em Espanha cantando não só em português como espanhol e até em...italiano!

Que fique claro: É historicamente correcto que uma Tuna universitária - seja espanhola, portuguesa, holandesa ou servo-croata - cante em castelhano. Esforcemo-nos nós por tornar normal que as tunas estrangeiras cantem em português, de forma positivista e não "aljubarroteira". Reparem, há tunas porto-riquenhas que positivamente já perceberam a beleza da nossa cultura....porque será?

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