A Aventura da "Tradição"....

João Caramalho Domingues no seu fantástico blogue Porto Académico fez-lhe merecida e pertinente referência . Aqui, repito-a com particular acutilância: Um magnífico artigo de Miguel Esteves Cardoso - 25/08/2010, Jornal o Público - sobre a tradição, essa ilustre desconhecida, que assenta na perfeição no que se reporta a muita "coisa" estranha que se vai passando no seio tuneril nacional....


"Manda a Tradição" - Miguel Esteves Cardoso.

Quanto tempo leva a criar uma tradição? E por quanto tempo se pode interromper antes de se perder? Eis a primeira frase de uma notícia no PÚBLICO de ontem: "Um homem entrou num forno de lenha aquecido a mais de 250 graus, durante a recriação do chamado milagre da Urgueira, que atrai anualmente milhares de pessoas." Respirei fundo, invocando a tolerância pelos velhos costumes e cantarolando o velho jingle do café Sical: "Cada terra com seu uso, todos com Sical."

Mas o resto do primeiro parágrafo desasossegou-me: "A tradição tem origem em finais do século XIX, mas esteve interrompida desde 1904, ano em que morreu o homem que a protagonizava, sendo relançada em 1996 pela Associação Etnográfica Os Serranos." Se a tradição começou no fim do século XIX - digamos 1890, só durou 14 anos. Quando morreu o homem que entrou no forno, decidiram acabar com ela. Continuou acabada por mais 90 anos, de 1905 a 1995. Desde 1996 foi retomada durante mais 14 anos. Quando a interrupção de uma tradição é maior (90 anos) do que o número de anos em que é cumprida (28 anos), foi a tradição que foi interrompida ou a interrupção que foi retradicionalizada?

Portugal está cheio de tradições deste género, que brotam e se desenterram por toda a parte, respeitando-se ou esquecendo-se conforme as conveniências. É à vontade do freguês. Que se há-de fazer? Nada. Esse à-vontade relativista é uma espécie de liberdade - e é a nossa verdadeira tradição. " (fim de citação)


Touché!

Comentários

OMEGA disse…
Touché a dobrar...
Aos anos que ando a batalhar nesta questão.